A área econômica queria que a intervenção no Rio fosse no dia 1º de março, para que se votasse antes a reforma da Previdência. Depois, alertou que não pode haver mais dinheiro para o caixa do Rio, a não ser o que irá para custear o aumento das operações das Forças Armadas. Os ministros saíram da reunião com a impressão de que agora ficou mais difícil a aprovação da reforma.
O poder no Rio está se desfazendo em todas as áreas. Na segurança, entretanto, a crise é mais aguda. Foi o que motivou a intervenção. E nesse ponto houve concordância em todas as cinco reuniões que o governo fez nas últimas horas sobre a situação. Os participantes das reuniões sabem que é um movimento de risco. A intervenção não terá resultados a curto prazo, vai levar tempo para que o cidadão do Rio sinta que a área de segurança tem comando. Todos temem o desgaste, principalmente os militares.
O general Braga Netto terá plenos poderes, e o Rio passa a ter na prática dois governadores. Nas longas reuniões sobre o assunto, a solução teve que ser construída com ousadia e cuidado porque nunca havia sido feita desta forma. Uma intervenção em tempos democráticos, mas que preserva parte da autoridade do governador eleito. Ao mesmo tempo, dá um comando claro a um setor no qual tem havido muito desencontro e pouca colaboração entre os braços do Estado. As Forças Armadas chamadas cada vez mais a apagar incêndios na área de segurança resistiram a mais esta escalada da sua atuação. Em determinado momento, disseram que aceitavam, “como soldados”, ou seja, é mais uma espinhosa missão. O governador Luiz Fernando Pezão também resistiu. Até que foi convencido pelos ministros Raul Jungmann e Moreira Franco.
A ideia inicial era de fazer uma intervenção também na área de Finanças e Planejamento. Isso foi afastado por duas razões: uma política e outra econômica. Se a intervenção cobrisse também essa área, seria, na prática, uma destituição do governador Luiz Fernando Pezão. Por outro lado, prevaleceu a ponderação dos ministros da área econômica de que parte fundamental do trabalho está feito. O Rio está executando um ajuste forte, entrou no plano de recuperação fiscal e hoje o Tesouro acompanha a gestão financeira do Estado. Além disso, a arrecadação está aumentando em parte pela subida dos preços do petróleo. Em resumo: o pior passou nesta área, e o problema mais grave concentra-se na segurança.
No ano passado, o Tesouro repassou mais R$ 600 milhões às Forças Armadas para cobrir custos logísticos das operações. Este ano, o cálculo é de novos R$ 600 milhões, mas com a intervenção do Rio é possível que sejam gastos mais R$ 50 milhões. Sairão do Tesouro. O Rio continuará arcando com as despesas tradicionais.
O governo analisou vários cenários e enfrentou muitos dilemas antes da decisão. A ideia de intervenção integral foi afastada porque prevaleceu a convicção de que isso criaria um ambiente de exceção em pleno calendário eleitoral e, na expressão de um ministro, poderia “contaminar” o processo eleitoral. Além de ser um ato traumático. As opções constitucionais eram decretar estado de sítio ou estado de defesa. Nos dois casos há suspensão de direitos e garantias individuais. No estado de defesa, até o sigilo de correspondência ou telefônico fica suspenso e pode haver limitação do direito de reunião e manifestação. A conclusão, disse outra fonte, foi que a situação não tem a gravidade que justifique medida tão extrema. Por isso, optou-se por uma intervenção localizada na segurança, com a transferência do poder ao general Braga Netto.
O general terá duas lutas: uma interna e outra externa. Terá que coordenar as polícias, bombeiros, sistema carcerário, unificando o que tem estado desunido. E incluir nesse diálogo a Polícia Federal, que até a última substituição da superintendência resistia à cooperação. A luta externa será controlar a crise em si.
A forma criada para se votar a reforma da Previdência é complexa. O que não era fácil ficou mais difícil. A estratégia é revogar o atual decreto, ir para a votação e baixar outro decreto. Todos os dois exigirão a aprovação do Congresso em sessão conjunta. O governo ainda não conseguiu os votos necessários para a reforma e agora há mais uma questão na agenda. Emergencial e difícil. “Não fazer nada deixou de ser uma opção porque o desgoverno estava se propagando”, me disse um dos participantes das reuniões.
O Globo