Falta combinar com os russos. Por Mary Zaidan – Heron Cid
Bastidores

Falta combinar com os russos. Por Mary Zaidan

3 de dezembro de 2017 às 10h07 Por Heron Cid

Sorte é parte da vida. Alguns tentam alcançá-la pela fé, muitos nunca chegam perto dela, uns a experimentam e outros a têm com fartura. Na política, o governador Geraldo Alckmin faz parte desse último time. Quase sempre está no lugar certo na hora certa.

Em boa parte das vezes isso nada tem a ver com o acaso.

Alckmin se desloca com aparente lentidão e não se sente confortável na posição de ataque frontal. Mas é hábil em emitir sinais trocados para confundir o meio de campo sem ser percebido pelos parceiros, adversários e comentaristas. No final, sobra-lhe a bola.

Sua assunção à presidência do PSDB – conchavo a ser homologado sábado que vem na convenção nacional da sigla — e a consequente aclamação como candidato dos tucanos ao Planalto são só mais alguns exemplos disso.

Como bom tucano, Alckmin evitou escolher um lado na disputa entre os grupos contrário e pró permanência no governo Michel Temer. Pelo menos publicamente. Não falou mal de ninguém, muito ao contrário. Ora elogiava o presidente interino da agremiação, senador Tasso Jereissati, ora aplaudia o governador de Goiás, Marconi Perillo, também pretendente à direção nacional do partido.

Depois de indicado como alternativa de conciliação na baixaria que se tornou o PSDB, o governador paulista defendeu o desembarque da nau temerista, garantindo – sem poder fazê-lo de fato – que o partido apoiará a reforma da Previdência.

Palavras fáceis de serem ditas. Afinal, o Congresso, o próprio governo Temer e o mercado sabem que uma nova Previdência só tem chance de ser votada por milagre. Não deve entrar na pauta deste dezembro, nem em 2018, ano eleitoral, quando políticos não querem saber de temas impopulares, e de Copa do Mundo, com o país de olho na Rússia.

Alckmin conseguiu apoio até da ala dissidente, encarnada pelos economistas tucanos, tendo à frente Elena Laudau, que, ao anunciar a sua desfiliação do partido no qual militou por 25 anos, endossou o governador paulista como candidato em 2018.

A barreira interna seguinte, materializada na disposição do prefeito de Manaus, Arthur Virgílio, de disputar as prévias, Alckmin pretende ultrapassar da mesma maneira. Já ungido candidato, topa ir às prévias e até se mostrar entusiasmado com a “democracia partidária”. Se Virgílio não desistir, será derrotado de forma retumbante, o que, na conta dos tucanos, pode até ser um bom empuxo para a campanha.

Mesmo perdendo quadros importantes, as hostes tucanas se mostram animadas. Creem poder protagonizar a tão propalada opção de centro que tanta falta estaria fazendo ao país, hoje condenado à polarização entre o ex Lula à esquerda e o ultradireitista Jair Bolsonaro.

Nem uma coisa nem outra. Nem mesmo a anterior. Ao que parece, a maior parte do eleitorado se cansou desse jogo e quer dar outros tratos à bola.

Embora primeiro e segundo colocados nas pesquisas de preferência de agora e que pouco medem o futuro, Lula e Bolsonaro falam para públicos restritos aos discursos raivosos que emitem. E Alckmin, ainda que se apresente como alternativa centrista, ainda terá de descobrir como mexer com a descrença do eleitor que não quer os extremos, mas também rejeita mais do mesmo.

Dificilmente o fará com o conjunto de obviedades e incongruências  exposto nas diretrizes divulgadas pelo presidente do Instituto Teotônio Vilela (ITV), José Aníbal. Documento da discórdia sobre o qual Alckmin não emitiu um pio. Por erro, acerto ou, simplesmente, tucanice.

Em seu favor, diga-se, Alckmin tem o fato de não fazer firula. Mas, pouco afeito ao ataque, demora a chutar, carece de precisão e não raro de mira.

Em 2006, negou as cores do seu time vestindo uniforme com logotipos do Banco do Brasil, Caixa, Petrobras e Correios para amaldiçoar as privatizações. Conseguiu a proeza de angariar menos votos no segundo turno das eleições presidenciais do que recebera no primeiro.

Mais do que negar um dos maiores legados do governo Fernando Henrique Cardoso, mostrou fragilidade de convicções. Foi enredado pelo adversário; tomou um olé. No tapetão vai virar presidente do PSDB e candidato do partido em 2018.

Como não dá para combinar com os russos, terá de suar muito a camisa para justificar a sua escalação para além da torcida.

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