Compreensível que poucos cariocas tenham cercado o prédio da Assembleia Legislativa do Rio para protestar contra o que ali ocorria na tarde da última sexta-feira – uma sessão convocada às pressas com o único propósito de libertar os deputados Jorge Picciani, Paulo Melo e Edson Albertassi, do PMDB, presos e acusados de receber milionárias propinas. Perderam um espetáculo e tanto de sordidez.
É bem verdade que sexta-feira foi dia imprensado entre o feriado da Proclamação da República e o sábado da preguiça para quem pode. A temperatura bateu os 35 graus. Deu praia.
A três meses da folia, as escolas de samba costumam promover ensaios técnicos. É tempo de trabalho insano nos barracões, de tirarem-se medidas para as fantasias e de fazer-se provas de roupas incompletas.
De resto, multidão alguma reescreveria o que se sabia escrito desde que o Tribunal Regional Federal da 2ª Região, em decisão unânime, mandou Picianni, Melo e Albertassi para o xilindró.
Estava escrito que a prisão seria revogada porque na Assembleia mandam eles. Estava escrito também porque a Lei Cármen Lúcia diz que político só fica preso se seus colegas quiserem.
Estranha, pois, a reação do ministro Marco Aurélio Mello. Ele disse ter visto com “perplexidade” a decisão da Assembleia Legislativa do Rio.
Mas foi dele o quinto voto na sessão em que o Supremo Tribunal Federal (STF) rendeu-se ao Congresso no caso de prisão de parlamentar e de suspensão de mandato. O ministro Celso de Melo empatou a votação. Cármen Lúcia desempatou.
O que valeu para devolver o mandato ao senador Aécio Neves, e livrá-lo do recolhimento obrigatório noturno, passou a valer para qualquer parlamentar. Meliante federal é igual à meliante estadual.
A não ser que os portadores das togas mais ilustres da República mudem de opinião outra vez. Parecem prontos a fazê-lo no caso de prisão em segunda instância. Lula agradece.
Quem sabe não darão depois o dito pelo não dito no caso da homologação de acordos de delação premiada? Por ora, segundo entendimento da maioria deles, cabe ao Ministério Público acertar a pena e as restrições de direitos com os delatores.
Mas Ricardo Lewandowisk, voto derrotado na ocasião, recusou-se a homologar um acordo. O STF virou Casa de Mãe Joana. Ou de Mãe Cármen.
Para que serve uma Justiça que não se faz respeitar? Diante de nossos olhos, e graças à nossa passividade, a Lava Jato (leia-se: o combate à corrupção) vem sendo liquidada à prestação.
Antes com um pouco de vergonha ou de medo da parte dos interessados. De uns tempos para cá, vencidos o medo e a vergonha, com a desfaçatez dos temerários.
O novo diretor da Polícia Federal, nomeado por indicação do PMDB de José Sarney, Renan Calheiros e Romero Jucá, antecipou o desejo de concluir até o início do processo eleitoral todas as investigações que envolvam políticos.
Pode ser bom ou mau. Uma vez que a Lava Jato respira por meio de aparelhos, a pressa servirá fatalmente para salvar quem não deveria ser salvo.
Sem estresse, porém. Sigamos protestando nas redes sociais. É mais seguro e confortável. Não atrapalha o lazer.
O fim do ano dos fogos de artifício está às portas. Depois, ziriguidum, oi!, que ninguém é de ferro. Em seguida, a Copa (“A taça do mundo é nossa, com o brasileiro…”).
Por fim, o ansiado reencontro com as urnas. Com o caldeirão das caras de sempre, e com as falsas novas caras.