Dada a crise do PSDB, o mais fácil, mais ligeiro e mais burro é culpar o senador Aécio Neves (MG), certo? Afinal, como ele ousa destituir Tasso Jereissati (CE) do comando? Não gosto de incomodar as almas simples, mas tenho uma pergunta: quem são os tais “cabeças pretas” — alguns de cabelo tingido, como Ricardo Ferraço — para dar ultimatos brancos a gente como Aloysio Nunes Ferreira, José Serra, Antônio Imbassahy ou Bruno Araújo? Cada um desses, com restrições aqui e ali, é capaz de dizer por que apoia o governo Temer. Até hoje, não entendi por que os “rompicionistas”, se me permitem o neologismo, querem romper. Além do oportunismo eleitoral, não vejo nada.
Para a autofagia, isto sim, caminhava o partido sem a intervenção. Se é como dizem, se os votos em favor de Temer dados nas duas denúncias estão sob a esfera de Aécio, então ele ainda tem influência em área substancial do partido. Por que Tasso Jereissati imaginou que poderia atropelar os adversários internos? Foi escolhido interino para costurar a paz, não a guerra.
O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, diz não ter sido consultado. E, afirmou, se fosse, não teria dado aval à destituição. Estatutariamente, Aécio pode fazer o que fez. Para mim, ainda é um ponto cego a razão por que o rompimento com Temer — a ser essa, de fato, uma questão relevante — seria do interesse de Alckmin. Estou entre aqueles que acham que dificilmente não será ele o candidato do PSDB à Presidência. A lógica sugere que o mais prudente seria unir forças em favor da reforma possível da Previdência e manter o PMDB a uma proximidade — e nunca distância! — prudente, buscando compactar o centro político, em vez de fragmentá-lo. A eleição está longe. O governo Temer do ano que vem não será esse que aí está.
Entendo, no sentido de saber a sua gênese, as razões eleitoreiras dos ditos “cabeças pretas” — alguns ali, com efeito, bastante jovens, circunstância em que a língua tem peso superior ao cérebro. “Por que preciso me ligar a um governo impopular?” É uma questão. Mas, então, vai se ligar a quê? Qual é o projeto que não seja o rompimento?
O próprio Alckmin deveria botar o bico de molho e atentar para as razões, por exemplo, dos “rompicionistas” tucanos do Nordeste. Desconheço entre eles quem ache que um candidato paulista, ele próprio ou João Dória, emplaca por lá. Basta, como diria Ivan Lessa, encostar o ouvido no peito desses tucanos, e se ouvirá bater o coração da desconfiança. Esse amor por Tasso, parece-me, também significa uma espécie de “hedge”, de proteção, para a possibilidade de a candidatura de um paulista não acontecer. Até onde ouvi os corações, rompimento com o governo à parte (e, insisto, incompreensível para mim, a não ser por uma leitura torta das pesquisas), a candidatura do governador de São Paulo tem mais chance de se tornar um imperativo caso o vitorioso seja Marconi Perillo.
O rompimento com o governo tornou-se um fetiche de utilidade zero, a não ser para meia-dúzia de deputados que pretendem ajustar seu discurso ao chamado espírito das ruas. Bem, há de se perguntar, então, se é mesmo o PSDB o seu lugar. A propósito: sei bem as medidas do governo Temer que o PT e Ciro Gomes, juntos ou separados (ainda acho que estarão juntos), pretendem atacar:
– teto de gastos;
– reforma trabalhista;
– mudança no marco regulatório do pré-sal;
– privatizações;
– reforma do ensino médio;
– disciplinamento dos empréstimos do BNDES;
– Lei de Responsabilidade das Estatais;
– reestruturação do setor elétrico;
– reforma da Previdência, ainda que mitigada…
A “pegada” oposicionista tucana seria exatamente qual? A ética na política? Digam-me cá: o MPF não emporcalhou o PSDB o suficiente, de sorte que o partido, hoje, arca muito mais com o peso das sem-vergonhices havidas na era petista do que o próprio PT? Por que o PSDB não transforma em parte de sua pauta positiva uma agenda que já está em curso em vez de brincar de “PT do B” com o governo Temer? Ajoelhar-se no altar da Lava Jato, sobretudo no altar dos desmandos, não é garantia de vitória. O candidato que hoje bateria a todos, Lula, dirige a operação tanto críticas justas como injustas. Seria o PSDB capaz de emplacar ao menos as… justas?
A intervenção decidida por Aécio abre uma porta para o PSDB. Desde que não se esforce para renunciar àquilo que é, com relativo sucesso na política quando se considera a presença nacional da legenda, para tentar ser aquilo que nunca será: um partido do alarido.
A demonização de Temer pode até eleger um arrivistazinho aqui, outro ali. Mas não elege presidente da República.
É impressionante que uma legenda possa jogar fora uma agenda que já tem em favor de uma que nunca terá. A menos que a agenda seja deixar o governo Temer.