Presunção de inocência, interpretação jurídica e estado democrático de direito. Por Ricardo Sérvulo – Heron Cid
Bastidores

Presunção de inocência, interpretação jurídica e estado democrático de direito. Por Ricardo Sérvulo

6 de setembro de 2017 às 11h06 Por Heron Cid
Ricardo Sérvulo, advogado

Interpretação jurídica sempre é variada e diversa, o que é algo muito bem-vindo. Tem um amigo meu, um grande jurista e promotor de justiça aposentado, que diz – “direito é como ramo de melancia, você leva pra onde quiser”.

Inegavelmente, cada um tem um entendimento que melhor lhe agrada ou apetece, sobre tudo na vida, inclusive em matéria jurídico-normativa.

Vejamos, pois, a polêmica da chamada “presunção de inocência” (linha constitucional que diz que todo mundo é inocente até o processo acabar). Já tive como verdade absoluta, que um réu condenado, mesmo depois de ser julgado várias vezes, inclusive por Cortes e/ou Órgãos Julgadores de Tribunais, deveria ficar solto, continuar a responder livre, sempre animado nos pilares do estado Democrático de Direito e no dito princípio da presunção de inocência.

Com o tempo, a gente vai entendendo que para o bem de tudo isso (do próprio Estado Democrático de Direito e seu funcionamento, para garantias coletivas e paz social mesmo) é necessário relativizar princípios vigentes. Sim, relativizar mesmo (muitos torcem o nariz pra isso, respeito). Entretanto, defendo, convictamente, que princípios constitucionais devem ser harmonizados, jamais, digo, jamais, absolutos.

E, faço uma confidência: se alguém me dissesse isso há 10 anos, eu nunca aceitaria e teria um ataque cardíaco.

Aí, o tempo passa, você amadurece, e começa a ver como funcionam os sistemas constitucionais de outros países: inclusive países da própria América Latina e, lógico, da América do Norte e Europa. Então, você percebe, que, “talvez, eles não sejam ou estejam tão equivocados”, e aceita que nós podemos revisitar e mudar algumas concepções e conceitos, que foram havidos em um momento constitucional de um pós-ditadura (1988), onde o legislador constituinte (autor da Constituição), fez valer no texto da Lei Suprema, claros propósitos, pois “saíamos de um experimento de um tempo de violações, próprias de toda atmosfera de regimes duros, sem ser repetitivo, porém enfático: ditatoriais” – onde a Carta Política deveria, digamos, “possuir uma vacina” contra qualquer ataque às liberdades individuais e/ou coletivas.

Só que esse tempo Constitucional agora é outro – é importante entender que uma geração Constitucional não pode e não deve anular outra (o próprio STF já disse isso).

O Estado Democrático de Direito pressupõe garantias, mas, nunca excessos! Tenho dito isto sempre que posso.

Ora, desvirtuamentos e exageros, e absurdos, e abusos de direitos, comportamentos que materializam uma brutal violação ao sistema de justiça de um país minimamente civilizado, devem ser evitados a todo custo.

Na verdade, penso que provamos no atual momento jurídico do Brasil, uma quadra própria de muitas imaturidades jurisprudenciais e institucionais jurídicas. Muitas vezes, embalada por ares ideológicos que são animados por doces propósitos, acredito. Contudo, acabam por açoitar a lógica, a razoabilidade e o bom senso, que vulneram a paz social.

*Ricardo Sérvulo Fonsêca da Costa*, professor de Direito Constitucional e advogado.

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