São João, a crítica de Elba e um buraco mais embaixo – Heron Cid
Opinião

São João, a crítica de Elba e um buraco mais embaixo

5 de junho de 2017 às 13h05 Por Heron Cid

Faria o mesmo se estivesse no lugar da brilhante Elba Ramalho. Lá, em Caruaru, onde se apresentou no fim de semana, a cantora paraibana criticou a forte presença nas festas de São João de músicos estranhos ao forró.

A crítica de Elba é ampla a um processo crescente de estilização do São João. Campina Grande, inserida neste contexto, é alvo mais exposto por que faz a mais famosa de todas.

Caruaru, a principal concorrente, também segue esta tendência. Na sua grade estão os sertanejos Gustavo Lima, Matheus e Kauan e Bruno e Marrone e os alternativos DJ Aloka, Lenine e Chico César. Mas não deixou de levar Elba e outros do gênero.

Se observarmos direito, o próprio forró – por sobrevivência – se adaptou a novos ritmos para atender à batida da vez. Wesley Safadão e Aviões do Forró são exemplos. A plástica da música deles está hoje mais próxima ao sertanejo do que ao próprio forró. Simone e Simaria, idem, e tantos outros que estão nas paradas de sucesso.

Nos discos e nos shows, ouve-se muitos metais e guitarras e quase nenhuma sanfona. Movimento parecido ocorreu em recente passado. A chegada do empresário Emanoel Gurgel com sua Mastruz com Leite abriu espaço para uma variação do ritmo, também criticada à época, e uma safra de bandas.

Se artistas considerados representantes do ‘verdadeiro’ forró não levantarem a voz defendendo o seu mercado e as tradições, quem o fará? Dotada de toda legitimidade, Elba – cantora respeitada e artista singular – está certa ao reivindicar o seu espaço e de tantos outros do seu segmento. Só não pode esquecer que esse movimento não é localizado e nem começou agora.

Aqui, neste espaço, alertei para o perigo da descaracterização do evento junino. Tão logo saiu o rol das atrações de Campina Grande acentuei uma necessária e crítica diferenciação: “São João é São João e bailão é bailão”.

No caso específico de Campina, uma conta rápida mostra que das grandes atrações dez são sertanejas e enquanto outras 35 são do forró, incluindo o ‘estilizado’, tanto que, excetuando as chamadas ilhas e os palcos paralelos no Parque do Povo, a festa foi aberta pelo emblemático Os 3 do Nordeste, com o simbólico Biliu de Campina cantando o hino “Olha pro céu meu amor”, e tem as estrelas Flávio José, Tom Oliveira, Amazan, Dorgival Dantas… E a própria Elba.

O que afasta o temor de quem, assim como eu, por defesa da responsabilidade do poder público com a essência cultural, quer a preservação das raízes. Esta tarefa, porém, não se faz por imposição. Mas por conscientização. Por que imagine se a programação fosse escolhida somente pelo gosto e opinião popular? Talvez nem a maravilhosa e talentosa Elba, de quem sou fã, figurasse na lista. É aí onde entra o debate. É aí onde está o buraco.

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