Marinês abriu os olhos e sorriu (Por Givaldo Medeiros) – Heron Cid
Crônicas

Marinês abriu os olhos e sorriu (Por Givaldo Medeiros)

2 de outubro de 2021 às 11h40

Não me ignorem se eu começar a falar do passado. Nem seu repetir, em meus textos, situações cada vez mais ancestrais. Não é nenhum ataque saudosista. Muito menos, que esteja buscando alguma perdida. Sigo os passos do médico que mais influenciou a psicologia moderna.

De tanto ouvir a repetição no discurso de suas pacientes, e era no feminino mesmo, posto que homens, ontem como hoje, adiavam indefinidamente sua ida aos médicos. Pois bem: de tanto ouvi-las repetir histórias do presente, como para enganar a si mesmas os reais conteúdos mnêmicos, Freud encaminhou-se para o passado, na procura de entender o que se passava no presente das pessoas daquele final de século dos anos 1800.

Pois tenho achado tudo muito repetitivo em nosso presente. Não esqueci que na minha puberdade, buscavam democracia, direitos e liberdade. Esperávamos que, enfim, o Brasil fosse uma grande nação. Quantas vezes ouvi: o Brasil é o país do futuro! Não é que continuamos na espera do futuro, quando, finalmente, nos tornaremos a grande nação desejada?

Nem queria tocar em temas dessa seara. Queria somente traduzir minha inquietação, que poderia estar presente em alguns significados do passado. Quem me despertou para isso foi uma menina de Alagoa Grande, que, com um toque de pandeiro, repetindo seu conterrâneo Jackson, começou a nos remeter ao passado da mais pura música popular nordestina.

Heloysa do Pandeiro, (foto) em sua batalha para a final, cantou “Aquarela Nordestina”, uma das músicas mais inspiradas sobre a seca, composição de Rosil Cavalcante, pernambucano que se radicou em Campina Grande até seus últimos dias. A música foi gravada por muita gente de antes e de agora, inclusive por Luiz Gonzaga. Mas nada se compara ao lamento que a banhou emoção, dado pela nossa Rainha do Xaxado, Marinês.

Com voz aguda e melodia plangente, ela pautou uma das mais instigantes interpretações para a música de Rosil. E foi a essa versão que recorreu Heloisa e, certamente, o sensível Carlinhos Brown, para impressionar o público que a escolheu para a final do The Voice, o Kids, em voto direto.

Como disse, na ausência de um presente mais fausto, tem sido no passado, onde vou buscar referências que nos estimulem a procurar o caminho torpe da felicidade. Pertencente ao “Nordeste imenso, onde o sol calcina a terra”, senti-me feliz por instantes. Entendi que, se não há folhas verdes, o passado, na conjunção com o presente, pode nos trazer motivos para acreditar que compomos um país imensamente verdejante, apesar das tristezas semeadas em seus campos. Olha, Heloysa não ganhou na final. Mas Lindo mesmo, foi assistir ao momento em que Marinês levantou levemente a cabeça, abriu os olhos e sorriu.

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