O caminhão de Zé de Preta (por Magno Martins) – Heron Cid
Crônicas

O caminhão de Zé de Preta (por Magno Martins)

6 de fevereiro de 2021 às 09h05

Recordações do passado ficam guardadas no baú das memórias para sempre. Esta incrível foto, resgatada na página das memórias deh Afogados da Ingazeira, aberta na Internet por Fernando Pires e agora tocada por Rodrigo Pires, me transportou ao túnel do tempo. A relíquia era o grande e único meio de transporte de muita gente na minha terra quando garoto entre os anos 60 e 70.

O caminhão misto de Zé de Preta não sei de onde veio, só sei para onde ia. Barulhento e afamado, por ser único na região, ia para as feiras de Ibitiranga, a antiga Boa Vista, distrito de Carnaiba, e ia também para Tabira. Tinha até um concorrente: a inesquecível grife “Ônibus de Jola”, o Jola que mais tarde virou prefeito de Tabira. Baixinho, divertido e muito sabido na política, ainda mora em Tabira. Por pouco, não se perpetuou no poder.

Zé de Preta e Jola são figuras memoráveis, atores de um tempo no Sertão que não se pode apagar. O passado é bom de qualquer ponto de vista. Se era melhor que hoje, boas recordações. Se era ruim, serve para dar risadas da situação e dizer que hoje está muito melhor. Enquanto existir recordações fotográficas sentimentais, o tempo passado não morrerá jamais. Revivo as memórias com uma imensa vontade de parar no tempo e ficar morando nelas.

O caminhão de Zé de Preta é apenas um retrato drumoniano na parede, uma dor de saudade que o tempo maltrata. Na verdade, nunca andei nele. Papai não deixava. Achava um perigoso meio de transporte, porque só andava apinhado de gente, igualzinho à foto. Papai foi muito zeloso com os filhos. Comer na rua, como se dizia por lá nos meus anos dourados, nem pensar. Comida boa e saudável, para ele, era o feijão com arroz de mamãe, o xerém com leite, a paçoca que ele mesmo batia com tanto primor num velho pilão no quintal lá de casa.

As recordações do passado a gente curte sentado na cadeira do tempo. Mutas vezes, sentado em um canto eu me encanto tanto com as lembranças do meu passado que caio aos prantos. Só me recomponho com o consolo de que devemos dar valor aos momentos e não às lembranças, porque o passado nunca volta.

Haverá um tempo exato em que o passado ecoará como cantiga de ninar. Trará de volta lembranças adormecidas, mas sempre vivas. Quando sentirmos saudades há sempre também um sorriso, uma lágrima talvez. Mas, com certeza, a estranha sensação de que nada foi em vão.

Blog do Magno Martins

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