Bolsonaro se tornou o avalista moral de Moro (por Mario Rosa) – Heron Cid
Bastidores

Bolsonaro se tornou o avalista moral de Moro (por Mario Rosa)

1 de julho de 2019 às 08h00
'Que beleza é a política e a sua dinâmica: é como um rodeio onde o peão monta nesse touro doido da História e tenta ficar o quanto pode', escreve Mario Rosa

Se há exatamente um ano, eu escrevesse aqui que o próximo presidente seria Jair Messias Bolsonaro, ia ser tratado com pilhéria. E, como se não fosse pouco, se além disso, eu vaticinasse que antes do governo completar um semestre, Bolsonaro se transformaria no sustentáculo político e avalista moral de ninguém mais, ninguém menos que Sergio Fernando Moro, dai já seria caso para internação imediata. Essa suposta coluna entraria para a antologia do jornalismo como um dos surtos públicos mais memoráveis e desconcertantes da atividade. Pois bem: tudo isso aconteceu, menos a minha capacidade de prever ambas as inexoráveis forças do destino (o que fala muito sobre colunistas, comentaristas e opinadores: em geral sabemos de tudo, só não sabemos de nada). A pergunta que não quer calar: qual o efeito dos problemas do ministro Moro para o governo e o presidente Bolsonaro?

Sendo bastante pragmático, governo nenhum gosta de problema nenhum. Então, numa primeira abordagem eminentemente teórica, bom não é. Melhor seria estarmos comentando a retomada impressionante do ritmo de crescimento, a exponencial e inédita criação de novas vagas de trabalho, a inauguração de obras há tanto aguardadas pela população, as filas cheias nos supermercados, o aumento dos índices de consumo. O bom mesmo… é bom mesmo. Mas existe o bom relativo também, na política. É como um licor, doce e de sabor amargo. Nesse sentido, o episódio envolvendo o ministro Moro não é de todo ruim para o presidente e seu governo. E por quê?

Primeiro, porque o governo ganhou finalmente uma “boa” crise. Ao invés de todas as anteriores, o presidente parece estar defendendo não apenas um personagem em controvérsia (no caso com excepcionais serviços prestados à nação). Mas, de repente, Bolsonaro virou o defensor da Lava Jato! É ele, defendendo seu ministro ferido, contra todas as hordas daqueles que querem a “volta da impunidade e o fim do combate à corrupção”. Então, pense numa briga boa! Melhor que transferir a embaixada brasileira para Jerusalém ou postar obscenidades no Carnaval. Foi fora do Twitter que o presidente ganhou de presente uma guerra boa de travar. E, de brinde, ainda se tornou o avalista moral daquele que até pouco tempo era o símbolo da moralidade! E de brinde do brinde ganhou o desgaste do único boneco de passeata que era maior que o seu, em popularidade, potencial, portanto, candidato à sua cadeira.

Que beleza é a política e a sua dinâmica: é como um rodeio onde o peão monta nesse touro doido da História e tenta ficar o quanto pode. Pois não foi o ex-juiz que veio para o governo Bolsonaro para conferir-lhe um atestado de qualificação ética e moral há menos de seis meses? Pois não é incrível que, agora, seja Bolsonaro que sirva e se sirva da fragilidade de seu ministro para ser o garantidor da seriedade de seu auxiliar e, por extensão, de seu próprio governo, ao envergar o papel de “protetor” dos princípios da Lava Jato? O teatro da política é fabuloso! E desafia a lógica simplesmente porque a lógica nem sempre é a variável dominante: primeiro vem a ilusão, depois a força e só então ela, a lógica predomina. A lógica só espoca e estraçalha quando uma realidade –normalmente econômica ou “moral”– é tão avassaladora que intoxica tudo e todos e provoca desmoronamentos. Por isso, governos são sempre tão fortes. Eles iludem, eles são fortes e a lógica? Ora, lógica é coisa de oposição…

Logicamente, os primeiros seis meses do governo Bolsonaro não são um compêndio exuberante. Mas ele jamais pode ser subestimado e, para todos os efeitos práticos, no dia de hoje, é o maior político em atividade no país, o maior nome, sem competidores próximos à vista. Nesses seis meses, se não conseguiu fazer entregas ou mudar o curso da economia, conseguiu uma proeza simbólica que não é trivial. Mudou essa palavrinha chata do nosso tempo, a “narrativa”. Você pode ser contra ou a favor das armas, mas fala sobre isso. Pode ser contra ou a favor da reforma da Previdência, mas fala disso. A favor ou contra os costumes, mas fala disso. Militares no governo? Fala disso. Pé atrás com o Congresso? Fala disso. A primeira família, o radicalismo ideológico e até a mudança nas multas da carteira de motorista? Fala disso. O Brasil debate Bolsonaro, a favor ou contra. Enquanto isso, ele dá seu aval moral a Sérgio Moro. E daqui a um ano? Nem ouso dizer como estarão as coisas! Você não vai acreditar…

Poder 360

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