Franquia de entretenimento (por Heraldo Palmeira) – Heron Cid
Bastidores

Franquia de entretenimento (por Heraldo Palmeira)

15 de abril de 2019 às 15h00
Os departamentos de comunicação e marketing estão lotados de gente muito jovem e sem qualquer vivência mais profunda (Reinaldo Canato/VEJA.com)
Tenho andado nas empresas e me assustado com o que encontro para interlocução. Pessoas esforçadas, estressadas. Boa parte com formação sofrível, sem traquejo e projeto profissional de longo prazo – parece pouco provável que tenham algum para a vida pessoal.Quase sempre desanimadas,sem referências, levando perguntas diretas: para que tudo isso? Por que vivem assim? Aonde pensam que vão chegar? Como sobrevivem sem resultados expressivos e presas a uma mesmice enlouquecedora?

Ficaram viciadas em balbuciar jargões de línguas estrangeiras – manifestação humilhada de gente colonizada –, copiar modelos que não nos servem, se esconder atrás de diretrizes mal concebidas e produzir relatórios de pouco sentido. Estão sempre ocupadas em reuniões intermináveis e rotinas extenuantes.

Em boa dose, são vítimas de executivos capengas que elaboram tais diretrizes e determinam dados para compor relatórios, escondidos atrás de plaquinhas solenescargos pomposos e salas inacessíveis.

Os departamentos de comunicação e marketing, que deveriam oxigenar o ambiente, respiram mal porque estão lotados de gente muito jovem sem qualquer vivência mais profunda. Uma gente metida a tecnológica, deslumbrada, digna de dó. Incapaz de elaborar algorelevante, gerar algum diferencial para a empresa. Ao fim e ao cabo, tudo roda no limite curto entre cargos e pose.

Os da comunicação merecem poucas letras, exatamente porque conhecem poucas letras. Não conseguem tangenciar a ciência que se meteram a estudar e praticar com as necessidades cotidianas. Não desconfiam que a comunicação é ferramenta poderosíssima para modificar cenários, impulsionar negócios e mudar a vida das pessoas.

No marketing encontramos pessoas desprovidas de capacidade para fazer uma análise conjuntural a respeito de qualquer coisapor mais simples que seja. De conhecer de fato o mercado em que atuam, os anseios reais dos clientes, e daí tirar estratégias de ação capazesde ampliar resultados, gerar fidelização ediferenciar a empresa da concorrência.

Apesar do baixo nível de conhecimento competênciaestão encarregadas de decidir sobre passos fundamentais para o negócio; de escolher que caminho seguir para encontrar o futuro onde suas companhias buscarão garantir a sobrevivência.

Farão isso sem conhecer a fundo esse velho mercado que evoluiu num passo a passo monopolista, patrimonialista, coronelista, paternalista, desleal, antropofágicohomicida… Até que, no ambiente atual de crise e desespero,tornou-se autofágico. E ninguém descarta sepotencial suicida.

Estão empoderadas – palavrinha ordinária que entrou na moda nos ambientes corporativos –, apesar de completamente perdidas na escuridão da ignorância, incapazes de enfrentar a autofagia reinante dentro e fora das corporações. Terminam copiando os concorrentes nas “ações de marketing”, jogando milhões no lixo porque não têm conhecimento, discernimento e capacidade de inovar, de correr riscos, de fugir da mesmice. Uma clara comprovação de que os inúmeros diplomas obtidos não passam de papéis voláteis que amarelam impiedosamente em quadros na parede.

Perderam a capacidade de ouvir, de tentar entender os desejos de quem querem alcançar (o tal público-alvo que deveria, muito mais adequadamente, ser chamado de público de interesse ou de objetivo) e de planejar o que fazer a partir daí.

Para um mercado sem lógica, estrangulado pela falta desabedoria, cabe uma frase – que um amigo não cansa de repetir – do velho e querido Spock, da sériJornada nas Estrelas: “A lógica é o começo da sabedoria, não fim”.

Em tempo: esse marketing rasteiro transformou série (de televisão) em franquia de entretenimento. Nada mais vazio. Como esse conceito tolo.

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